terça-feira, 24 de agosto de 2010

Discografia recomendada: Rise to your knees – Meat Puppets


Houve um tempo em qu rock alternativo, era, literalmente, um rock alternativo. Explico: é que o termo designava bandas que faziam um som diferente do que era comercializado massivamente. Ou seja, desde quando algum desajustado se negou a fazer rock como os outros, podemos dizer que há rock alternativo. Ultimamente, entretanto, a “música alternativa” virou praticamente um gênero, tendências modernets que a internet difunde, toca no MTV Lab Now e, acima de tudo, na maior parte das vezes é chato.
Mas nos anos 1980 não era assim. Com o pop cada vez mais forte, o hard rock ganhando um contorno extremamente cafona (adjetivo que serve para toda a década) e a onda punk diluída, algumas bandas nos Estados Unidos faziam um som bastante desalinhado em relação ao que tocava na rádio. Eram elas Sonic Youth, Dinosaur Jr., Big Black, Pixies... uma legião. É também o caso do Meat Puppets, grupo de Phoenix, Arizona. Unindo folk ao punk, a banda liderada pelos irmãos Chris e Curt Kirkwood, lançou diversos bons álbuns naquela década, destacando-se o clássico Meat Puppets II.
Nos anos 1990 eles assinaram com uma grande gravadora e, após participarem do Unppluged in NY do Nirvana, alcançaram algum sucesso – moderado, a bem da verdade. É de 1995 o ótimo Too High to Die, talvez o registro do trio e “Backwater” um semi hit.
Depois de passar por algumas trocas na formação, alguns períodos inativos e com algumas prisões de Chris Kirkwood, os Meat Puppets voltaram nos anos 2000. Outra dessas voltas caça-níqueis que tanto se arma por aí? Eu duvido, pois o grupo não é um nome tão reconhecido para ganhar malas de dinheiro por uma reunião. Voltaram, certamente, porque não tinham nada de melhor para fazer de suas vidas. Até porque, o álbum que marca a volta, Rise to Your Knees é um belo registro, pouca gente faz algo melhor da vida, mesmo! Com belos arranjos, músicas mais intimistas e canções em construídas, esse cd poderia estar em listas dos melhores da década, se os críticos não estivessem tão preocupados que a última novidade do My Space. Porque a crítica musical reproduz a limitação da sociedade de só entender como digno de atenção o novo. Qualidade por qualidade, os “velhinhos” do Meat Puppets valem mais, bem mais, do que qualquer CSS e derivados. Qualidade confirmada em seu último álbum, Sewn Together, de 2009.
Aos interessados, fica a indicação de Rise to Your Knees e, abaixo, um link para o clipe de “On the Rise”.
http://www.youtube.com/watch?v=CnOD0oDAXVU

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Como não me tornei jogador de futebol

A história seria assim: anos nove anos, meus pais me colocaram numa escolinha de futebol. Apesar de magro, logo comecei a me destacar jogando na defesa, com desarmes cirúrgicos. Fui me aperfeiçoando e me tornei um zagueiro de classe. Era disputado na cidade em campeonatos de várzea e vencedor com o time do colégio. Aos dezesseis anos, participei de peneira no Guarani, de Campinas. Passei e, dois anos depois, me tornei profissional. Virei pagodeiro e mulherengo. Joguei por clubes grandes do Brasil e atuei por equipes medianas da França e da Itália. Encerrei minha carreira numa volta às origens, jogando sem salário pelo Atlético Tricordiano.
Obviamente, se assim tivesse sido, haveria um “não” sobrando no título. O leitor interessado na “verdade” pode guardar só a primeira frase ali de cima, a da escolinha de futebol. Nela, aprendi fundamentos como cabecear, tocar, correr com a bola, entre outros. Participei de amistosos pelo sul de Minas e até de um internacional, contra um time japonês que excursionava pelo Brasil. Recebi várias palestras do tipo “sou vivo, não uso drogas”, inclusive uma, no CT do Palmeiras, com o Profexô, conhecido pela Luciana Gimenez como “Luxesburger”. Aprendi que mesmo uma água de galão com gosto estranho podia ser melhor do que Coca-Cola quando se jogava no sol das 14 horas. Que os seus colegas te chamam de “baixinho” mesmo que sejam menores do que você. E que vestiários cheiram a urina.
Mas eu não seria um jogador de futebol. Sequer existia essa ilusão para o treinador, meus pais e mesmo para mim. Meu desafio era ao menos jogar dignamente – o que até chegou a ocorrer quando, anos depois, no futsal, eu era um fixo razoável com chances de ir para o time do colégio. Só que nunca levei o menor jeito com esportes, o que não surpreende ninguém que me conheça. E essa experiência de escolinha tinha tudo para ser traumática. Eu não jogava bem, era mais novo que os outros garotos, era bastante protegido (um desses “meninos de apartamento”, embora morasse em casa) e sofro de timidez crônica. Nesse contexto, eram consideráveis as chances de eu ser esmagado por tal ambiente. Não foi o que ocorreu, entretanto. Embora não fizesse “amigos do peito” eu tinha uma boa relação com a maioria dos colegas. Mesmo sem me integrar plenamente, consegui me adaptar ao “mundo do futebol infantil”.
E assim costuma ser. Apesar da minha “total falta de malemolência”, nunca fui daqueles meninos que lancham na sala de aula, com a companhia dos girinos da aula de ciências. Integração social nunca foi o meu forte, mas não me vejo levando algum episódio de exclusão para um divã. De algum modo, eu sobrevivo.
Não tenho uma história gloriosa como a do primeiro parágrafo. Virei um escritorzinho voluntário de horas vagas e um “dente-de-leite” na modalidade intelectual. Estou em contagem regressiva para adentrar numa crise homérica do tipo “o que eu faço agora? eu preciso de um emprego”. Quando ela se estabelecer, espero lembrar que, por mais feio que o diabo seja, até que nossa vida termine (tabelinha com o texto anterior!) a gente sobrevive. Se não der para fazê-lo bem, fica como meta alcançar a dignidade.

domingo, 1 de agosto de 2010

“A morte” ou “Ela vem, cheia de amor pra dar”

“Ó Morte, velho capitão, está na hora!levantemos âncora!
Este país nos entedia, ó Morte! Embarquemos!” (Baudelaire)

É uma manhã normal, você está deitado, num sono tempestuoso de ressaca da noite anterior e o domingo promete ser arrastado como outro qualquer. Só que do seu quarto dá para ouvir o choro de sua tia e sua mãe e você entende: desta vez, a morte resolveu visitar sua família. Ela pode até demorar, mas ela comparece. Sempre.
E por mais contraditório que seja, já que convivemos com a morte desde quando matamos nossos primeiros pets com nossa “ternura excessiva estilo Felícia”, jamais estaremos preparados para a morte. Mesmo que a realidade de que todos nossos entes queridos são passíveis de zarpar desse plano, a teoria e a prática, pra variar, não se encontram. Imaginar perder algumas pessoas, só imaginar, já deixa alguns com lágrimas nos olhos. Preparação para a nossa morte, então, nem se fala. Lidar com a efemeridade da nossa vida é bem complicado.
Mas a morte é uma realidade. E democrática. Atende a todos, às mais diversas classes sociais (embora alguns ricaços tentem tapeá-la deixando-se congelar na esperança de serem revividos em um futuro distante), tendências políticas, índoles... Se você é ruim, morre. Se for bom, morre também. Além disso, a morte também é democrática nas diversas formas em que aparece. Desde casos trágicos de acidentes, assassinatos ou doenças, até em episódios cômicos (dependendo do humor de quem observa), como no célebre caso do mergulhador que morreu em um incêndio, pois foi pego por um helicóptero que levava água do mar para apagar o fogo.
Talvez a grande dificuldade de nossa parte seja entender que vida e morte são entidades ligadas, praticamente uma coisa só. Só morremos porque, antes, vivemos. Se mudamos o ponto de vista, podemos dizer que a vida é só o caminho que leva até a morte. Recentemente, dois óbitos ocuparam espaço na mídia. Eliza Samúdio, supostamente assassinada a mando do goleiro Bruno, teve a interrupção de sua existência em decorrência do tipo de ganha-pão que escolheu: pensão milionária ao se envolver com gente rica, não necessariamente boa. Já o filho da Cissa Guimarães, atropelado andando de skate em um túnel, morreu ao praticar um esporte que, essencialmente, é urbano – ou seja, oriundo de um ambiente de colisões quase naturais. Não deixa de existir certa linearidade da vida com a morte.
Às mortes supracitadas, prefiro a do meu tio, aquela anunciada no princípio do texto. Morreu dormindo, do coração, depois de passar um dia na roça, voltar para casa, comer uma carne e tomar uma pinguinha. Uma morte serena. Porque, com alarde ou não, no fim das contas, toda existência é efêmera, mesmo.