Quando, em agosto de 2007, a
vocalista Anneke van Giersbergen deixou o The Gathering, o chão se abriu para
os raros fãs da banda. Pois não era uma simples troca de integrante. A entrada
de Anneke marcou a mudança no som do grupo, que progressivamente foi
abandonando estilos mais pesados (doom/ gothic metal) para sonoridades mais
atmosféricas, que a banda denominou trip
rock (alusão ao trip hop de
grupos como o Portishead).
Mais do que esse marco
simbólico, Anneke se tornou a “cara” do The Gathering. Com sua bela voz e o assombroso
carisma, a cantora não poderia ocupar lugar diferente. Foi tão protagonista na
banda que resolveu dar seu vôo solo. Ser seu próprio rosto.
E agora, cinco anos depois,
podemos ver que o rompimento, embora dolorido aos entusiastas do grupo, foi
honesto. Everything is changing,
terceiro álbum solo de Anneke (os dois anteriores usaram o nome Agua de Anique
como transição) indica que a cantora está convicta em flertar com o pop. Vide o
clipe de "Take me Home".
Já o The Gathering lançou
nesse mês seu segundo trabalho pós-Anneke, Disclosure.
Esse álbum teve maior participação de Silje Wergeland (ex-Octavia Sperati), norueguesa
que assumiu os vocais. O anterior, West
Pole (2009), ela encontrou praticamente pronto. E Disclosure é um atestado de que o The Gathering segue fiel ao seu trip rock, sem soar repetitivo no
caminho que escolheram.
No álbum novo, os holandeses liderados
pelos irmãos Hans e René Rutten incorporam mais características do rock
progressivo, outro rótulo que costuma ser utilizado para definir sua
sonoridade. Não o progressivo de intermináveis solos virtuoses, é bem verdade, mas
na exploração da capacidade sensorial da música.
“Paper Waves”, apresentada ao
público brasileiro no show da banda em julho de 2011, abre o disco. É uma faixa
eficaz como abertura do disco, mostra que o que virá a seguir é promissor. Os
saudosistas podem até sentir falta de Anneke, mas Silje cumpre bem a árdua
tarefa de substituí-la. Sobretudo por soar bem e em seu próprio estilo.
“Meltdown”, em seguida, é a
música mais ousada do cd. Além do vocal masculino (estreia do tecladista Frank
Boeijen na função), algo que não ocorria desde “A Life All Mine”, de Souvenirs (2003), a música inicia com
uma dinâmica bastante moderna. Porém, pela metade, ela toma rumo mais
introspectivo. De fato, Disclosure é
um álbum de músicas longas e com variações internas. “Heroes For Ghosts”,
quarta faixa, que teve um clipe lançado no ano passado, dura mais de dez
minutos. Épica, mostra uma banda entrosada.
“Paralyzed”, terceira música,
é a que mais se aproxima de uma balada no disco e, de fato, tem potencial para single. Conta com uma bela melodia vocal
e um acompanhamento bem digno.
Disclosure tem
também uma faixa dividida, “Gemini I” e “Gemini II”, essa encerrando o cd. “Missing
Seasons” talvez seja a canção que menos chama a atenção no cd. “I Can See Four
Miles” reforça que, mais do que faixas grandes, temos músicas grandiosas no
décimo álbum de inéditas do The Gathering.
O supracitado show dos
holandeses em São Paulo, no ano passado, mostrou que o impacto gerado pela
saída da ex-vocalista afetou o número de seguidores do grupo. O público que
compareceu naquele domingo foi consideravelmente menor que aquele do outro show
da banda no Brasil, em 2006, ainda com Anneke – o tamanho do local onde os eventos
ocorreram também transmite essa realidade, do Via Funchal para o Hangar 110.
Disclosure nos
faz concluir que, junto da separação entre os integrantes, também ocorreu uma entre
seus seguidores: foram-se os(as) tietes de Anneke, ficando os verdadeiros fãs
da banda. Pois musicalmente é inegável que o The Gathering mantém sua
identidade. Com mudanças, claro, pois trata-se de uma característica de sua
trajetória. Mas eles seguem explorando as possibilidades do trip rock. Seus fãs da banda podem ser
poucos, todavia são convictos de serem uns privilegiados.
Concordo plenamente.
ResponderExcluirSou um desses privilegiados.
Parabéns pela resenha
Também fiz uma resenha da banda sobre o show em São Paulo no ano passado com visão e detalhes bem particulares detalhes antes despercebidos, quando quiser retribua a visita. Abraço.
Folha.
Passei duas semanas sem conseguir ouvir outra coisa. O álbum é coeso, belo, intenso. E a resenha soube descrevê-lo - e à saga da banda, com ou sem sua musa maior - muito bem. Vida longa ao The Gathering e a seus admiradores!
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