quarta-feira, 30 de junho de 2010

sem título 2

Cinco horas da tarde de uma terça-feira e eu aqui, sendo maquiado. Em uns vinte minutos a gente entra no ar, então é essa correria. Ajeitar iluminação, áudio e as imperfeições da minha pele. Fico pensando: porque mesmo eu fui fazer jornalismo? Nem é difícil lembrar. Não existiam muitas opções dignas para um adolescente que escrevia melhor do que os colegas e que conseguia desenvolver alguns argumentos sem inundá-los de gírias...
Mas eu não queria fazer tv. Minha idéia era virar um colunista de jornal, desferindo críticas sobre qualquer coisa. Lógico, não seria nada mal ter um cantinho lá no caderno de esportes, ou no suplemento de cultura de um grande periódico. Mesmo escrever sobre política eu toparia. Mas não. Durante a graduação, todo aquele alarde dos professores, a mídia impressa vai acabar, não tem jeito. E o jornalismo em si está em crise. Então, vá para a televisão, eles diziam. Paga-se melhor (ao William Bonner, eu descobri), você é um bom comunicador e não pode desperdiçar seu rostinho bonito em uma redação empoeirada. (Bom, acho que esse último argumento fui eu mesmo que formulei...) A questão é que cá estou eu.
Arrumo-me, levanto o microfone, já entrarei no ar. E ficarei por uns vinte segundos, se muito. Vai acabar Espanha 1 x 0 Portugal. Estou cobrindo a festa de uma comunidade portuguesa, que, com esse resultado, azedou. Quem inventou que é interessante mostrar esses imigrantes fajutos acompanhando jogos de Copa do Mundo? Não que eu queira salvar o mundo, mas isso é amenidade demais. E chato pra porra. Paciência, recebo para isso. E depois eu vou dar uma mãozada naqueles bolinhos de bacalhau e virar alguns copos de cerveja. Ah, se vou...

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Abrigos de inverno

É um belo espetáculo andar pelas ruas nas manhãs de inverno Mesmo que a baforada gélida secando nossa pele diga o contrário. Pois é bonito ver as pessoas e suas satisfações em andar vestidas para o frio. A relação que se tem com um agasalho vai além de objetividade. Encontra-se neles um abrigo, um refúgio, como um guerreiro em suas armas. É divertido, todos se curtindo com seus moletons.
Com seus casacos.
Jaquetas de tecido sintético.
Blusas de lã.
E os afetados apelando para cachecóis.
Uma beleza.
Quando criança eu também vibrava usando roupas de inverno com capuz. Era como se transformar em algum personagem de desenho. E minha jaqueta de Macgyver, como um colega bem observou, também me fazia esbanjar poder. Com tantos bolsos, eu poderia levar Deus sabe o quê nela.
É isso que o inverno é, uma experiência lúdica.
Hoje eu não visto nada disso. Uso bermudas e camiseta, porque eu vou pular na piscina daqui há dez minutos, então, tanto faz frio agora. Atravesso a Antônio Carlos e fico vendo toda essa gente em carros, esse abrigo que custa a partir de 20 mil e uns bons trocados. Com vidros fechados e ar quentinho, o símbolo maior de liberdade a ser adquirida pelo indivíduo. Sim, todos esbanjando a liberdade em ir de carro da casa para o trabalho e vice-versa. E nas férias, ir para Guarapari, ou para Ubatuba, se estiver no sul de Minas, ou para Santos, se for um paulistano... E ser livre para ter seu próprio cano de descarga. Belezuuuura!
Eu vou pular na piscina, e ela não permite abrigos. Uma tia ao lado levou o seu até a beira da água, o seu roupão, mas ele não vai acompanhá-la na hidroginástica. E nada vai me ajudar nos 600m de um vez só que a professora me pede. Nenhuma daquelas roupas de alto desempenho. Só meu fôlego, bom para um magrelo.
Meu abrigo vem depois. Japão x Camarões. Em seguida, ler um texto, hoje é dia de Koselleck. Para mais tarde escrever academicidades que talvez uns dois no universo vão ler. Urrul!
E meu blog? Não, ele não. Logo vou virar um Salinger, só que sem nenhum livro bem sucedido. Escreverei só para mim, não vou publicar nada. Porque o ego é o refúgio dos fortes. Yeah!

terça-feira, 1 de junho de 2010

Futebol, entre ranzinzas e a alma humana

Vem chegando uma nova Copa do Mundo de futebol e não dá para se ignorar essa data. Afinal, ela é prato cheio para os ranzinzas de plantão, destilando pragas contra o futebol e todo o teatro que se faz ao seu redor.
E não dá para tirar um pouco da razão desses indignados: os noticiários se esvaziam de outros temas; a combinação verde amarelo deixa de ser cafona; “a galera toda” se encontra para ver os jogos do selecionado brasileiro, o que provoca uma aglomeração grotesca de torcedores que só querem um motivo pra reafirmar sua vida burguesa, ou desejo disto...
Apesar disso tudo, inda acho perde quem se deixa dominar pelo mal humor e não se diverte com a Copa. Poxa, como o futebol pode ser divertido! E falo até de uma diversão intelectual, para aqueles que gostam de “observar a alma humana”. Albert Camus já dizia que muito daquilo que ele aprendeu sobre os homens foi nos seus tempos de futebolista. Realmente, o esporte é uma janela privilegiada. Ali, temos indivíduos doando-se por uma paixão (a nacional, por exemplo), colocando à prova sua capacidade de realizar seus objetivos, testando seus limites físicos... E escancarando o quão humanos eles são.
Me vem à mente a final da Copa de 2006. Zidane, líder da França, conhecido por jogar com classe e inteligência, agride um adversário que ofendeu a honra de sua irmã. Não uma agressão qualquer, uma violenta cabeçada no peito. Ou seja, até os gênios perdem a cabeça. (e os escritores medianos não perdem os trocadilhos infames...)
Nelson Rodrigues dizia que “em futebol, o pior cego é o que só vê a bola... Se o jogo fosse só bola, está certo. Mas há o ser humano por trás da bola, e digo mais: - a bola é um reles, um ínfimo, um ridículo detalhe. O que procuramos no futebol é o drama, é a tragédia, é o horror, é a compaixão.” Pena daqueles que preferem repetir o clichê de que “são apenas 22 homens correndo atrás da bola”. Eles perdem uma bela diversão.