terça-feira, 29 de maio de 2012

Jeff Buckley: 15 anos


Minha intuição sempre foi apurada em relação à música. Grande parte das bandas e artistas que compõem o meu panteão foram percebidos com rápidas amostras. Por isso, poucas decepções guardo comigo nesse tempo em que me tornei um apreciador musical, com a dedicação que tal arte merece.

Com Jeff Buckley não foi diferente. Ainda muito jovem, lá pelos treze anos, vi pela primeira vez um vídeo dessa figura, por intermédio de Terence Machado e seu Alto Falante. Na época, porém, meus ouvidos necessitavam de mais distorções, assim como os homúnculos em Full Metal Alchmist necessitam de pedra vermelha. Mesmo assim, lembro que a música, que não lembro qual era, me causou uma ótima impressão, embora não fosse o que eu buscava escutar.

Guardei o nome e a fidelidade ao programa da Rede Minas. Vi mais algumas vezes Jeff Buckley nesse canal até o Kazaa e minha internet discada me proporcionarem um maior contato com a obra desse compositor. E, até hoje, nas minhas audições já não ocasionais, sinto o mesmo espanto daquela primeira vez. Primeiramente, o mais óbvio, pela qualidade vocal. Será que conheço outros vocalistas que atinjam agudos tão certeiros, prolongados, angustiados, sem destruir o timbre de sua voz? Dificilmente. Jeff Buckley cantava com facilidade melodias incertas que vão desde o suspiro de “I love you, but I´m afraid to love you” em So Real, até gritos prolongados do refrão “Wait in fire” de Grace. Só por isso, ele já seria um inigualável acréscimo à produção musical.

Entretanto, ele acrescentou bem mais. Sua sensibilidade aliada de sua capacidade como compositor fazem com que suas músicas sejam dotadas de uma carga de alto teor emocional. Existem bons compositores que fazem música agradável. Os melhores, porém, são aqueles que colocam um algo mais que dá vida à composição. Justamente, a vida do artista. Por isso a importância da dinâmica interna de suas músicas, com dedilhados leves na guitarra e distorções convivendo em uma mesma música; ou o descontraído cover de Yard Of Blonde Girls e Everybody Here Wants You em um mesmo disco. Dinâmica. É difícil encontrar músicas melancólicas com variações. Talvez por isso eu não goste de Belle And Sebastian. Nem afins.

Por isso e muito mais, não consigo pensar em Jeff Buckley como mais um talento que tenha surgido na música pop. Isso é impensável. Ele está em uma categoria muito mais seleta, a de artistas que atingem uma profundidade muito além da do convencional. Categoria que, com o perdão dos puristas que buscariam pares na década de sessenta, ou algo do tipo, vejo amplamente desabitada.

Infelizmente, escrever sobre Jeff Buckley implica esbarrar no tema da sua morte. Evento que, penso, foi uma das maiores tragédias que a música já vivenciou. Afinal, morrer afogado, antes de concluir os acertos do seu segundo álbum foi uma saída triunfalmente romântica. Trágica, sobretudo. Com todo o peso que essa palavra possui. Nem nisso o filho de Tim Buckley é superável.

Como o fluxo do tempo é contínuo, um rio maldito correndo enlouquecido, completam-se 15 anos que Jeff Buckley morreu. Datas, quem precisa delas? Contar os anos que se passaram desde que sua potente voz foi silenciada não ajuda a manter o ânimo em estado aceitável. Consola pensar que suas músicas estão aí e outras pessoas podem sentir o espanto que o clipe no Alto Falante me causou. Ao menos isso.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Projeto Pagode em Prosa #4

A obsessão de Thiago atendia por um nome: Vanessa. Há tempos não tirava a morena dos pensamentos. Estava apaixonado, qualquer assunto o lembrava dela. Mas não era correspondido. E o inverno ficava mais monocromático a cada rejeição que sofria.

Ele era um sujeito romântico. Tinha um vasto repertório de galanteios. Enviou-lhe flores, caixa de bombons, dedicou música na rádio, fez amizade com a família dela... e nada. Ia até mandar um daqueles carros de mensagem, mas, sorte a dele, amigos o alertaram antes que fosse tarde. Vanessa agradecia os presentes, mas oferecia a amizade e nada mais. Thiago até fazia o papel de confidente, escutava com atenção as mágoas da garota sobre o ex-namorado, por mais tedioso que isso fosse. Era um bom moço.

As opções estavam acabando e o rapaz armou uma última investida. Se não desse certo, não haveria mais nada a se fazer. Portanto, ele se preparou ao seu melhor estilo: cortou o cabelo, estreou uma camisa nova e foi generoso ao salpicar perfume em si mesmo. Chamou Vanessa para um passeio pela praça. Se suas atitudes não surtiam efeito, ele seria direto e faria uma declaração de amor, a mais comovente que ela jamais havia escutado.

Naquela noite, ele segurou as mãos dela, olhou em seus olhos, recitou Shakespeare. Mas Vanessa não se manifestava. Então, Thiago partiu para o improviso. Apelou para o céu.

__ Você é tudo para mim, se me aceitar como seu namorado, não haverá limites que não ultrapassarei por você. A Lua, ali, tá vendo? Se me pedir, eu busco ela. Se bem que você é muito mais brilhante...

E nesse momento, Vanessa foi despertada de sua impassividade:

__ É sério? Você busca se eu pedir?
__ Claro, meu amor. Por você, tudo.
__ Ué... eu acho que eu quero a Lua. Pega ela para mim.

Thiago riu. Pela primeira vez Vanessa correspondia a um galanteio dele. Estava dando certo.

Ou não.

__ Me traz a Lua, Thiago. É sério.

Era mesmo. Vanessa queria a Lua, de verdade. 

E Thiago era um bom moço. Ao chegar em casa, ele procurou no Google o que era preciso para se tornar um astronauta.

Canção homenageada:

sexta-feira, 4 de maio de 2012

O Guia do Mau Humor - Capítulo 3: "As redes sociais"


Hoje, as redes sociais são essenciais nas nossas vidas. Nelas nos comunicamos, trocamos informações, nos mobilizamos para salvar o mundo, compartilhamos textos de blogs dos coleguinhas (o que é extremamente simpático)... e nos irritamos. Por que não? Afinal, ainda que virtualmente, são seres humanos que estão ali. Nem todo F5 que damos vai nos dar orgulho de nossa espécie...

Um problema fundamental nas redes sociais: a facilidade de confundir público e privado. Mal que nós conhecemos bem, Brasília que o diga. Mas aqui em outro sentido. As pessoas não têm a menor ideia do que deve ser compartilhado com seus amigos e o que deve ser guardado na intimidade.

O que nos leva ao vilão das redes sociais: a informação desnecessária. É muito freqüente no Twitter. Pessoal, será que é importante dizer para a comunidade o que você comeu hoje? Se estava bom? Os efeitos disso em seu intestino? Ou o que você fez a cinco minutos, e agora, e o que vai fazer nos próximos dez?

Bom senso, senão você perde um amigo mal-humorado. Lembre da sábia “tirada” do vocalista do Placebo no Serginho Grosiman: “sabe, meu caro amigo, às vezes menos é mais”. Brian Molko, ícone do mau humor. http://www.youtube.com/watch?v=Zh6ptRP7KzA

Vivemos em um tempo em que as pessoas expressam suas carências em atualizações na internet. Não basta estar triste porque seu periquito está doente. Você tem que colocar “LUTO” na frente do seu nome. Não basta visitar o sul do Paquistão. É preciso postar as 938 fotos que você fez. Ainda que o sorriso do tipo “aplicaram botox na minha bochecha” seja um só.

Aliás, outro terror: o “dig din feelings”. Marketing pessoal, esnobismo, a gente vê por aqui. As redes sociais são um instrumento para dizer ao mundo o quanto você é foda. Ou acha que é. Se as pessoas fossem tão confiantes quanto seus perfis virtuais são, não sei porque tem tantos caras hiperativos dando palestras motivacionais, berrando “SIM, VOCÊ VAI CONSEGUIR. POR QUÊ? PORQUE VOCÊ É O CARA!”.

Antes de ir ao próximo tópico, voltemos às fotografias. No passado, quando alguém lhe recebia em casa e o obrigava a ver as fotos ou/e o vídeo do casamento, isso era considerado uma eficaz forma de tortura. Hoje em dia, com as câmeras digitais, postam-se até fotos de batizado do cachorro. E as pessoas conferem. Voluntariamente. Cyber-sadomasoquismo?

Mas não para, não para, não para, não. Se até agora não foi o suficiente para você ver o quanto as redes sociais atiçam seu mal humor, é hora de apelar: as baranguices. Sim, o Facebook está dominado pelo brega, no mal sentido. Fotos de bebês guti-gutis, ou de gatinhos idem, com mensagem de “bom dia”? Sim, estão lá. Correntes do tipo “se não compartilhar vai morrer seco”? Check. E frases auto-ajuda, na falta de melhor definição? Também temos. Para todos os gostos. De frase do “Padre Gato” até o Mr. Catra, passando por Airton Senna, Caetano Veloso, Dean Winchester (personagem de “Supernatural”), e os literatos pops em citações aleatórias ou falsas, mesmo. A cada compartilhamento é uma revirada no túmulo do Caio F. Abreu e da Clarice Lispector. Nessas horas, você até fica feliz em só ter um blog pouco acessado.



E nossos amigos que querem nos “conscientizar” compartilhando fotos de animais/ pessoas mutiladas, ou com campanhas do tipo: “no Brasil um comediante [que fala coisas ofensivas] é levado a sério e ‘uspolítico’, na brincadeira”? É ou não para amar, só que ao contrário?

Enfim, vamos reconhecer: não dá mais para viver sem internet. Mas passar a vida toda sem cometer ao menos um “orkuticídio”, ou seja lá como o termo for atualizado? Só os fortes.