quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Sentimentos da noite


(19:03) Poxa pessoal eu to tirste hj L Dia peeeeeeeessimoooo!!!!!!!!!!1!

(19: 05) * tristre 

 (19:08) Tah foda nem pra escrever to prestando #acabalogodia

 (19:22) Sou tao retardado, to rindo sozinho de não conseguir escrever ~triste~ huehuehue #naodesistonunca

terça-feira, 4 de novembro de 2014

País dividido

João foi ao estádio ver seu time do coração jogar. Lá, ele achou a festa bonita, tanta gente vestindo roupas com as mesmas cores que as dele, cantando e declarando amor ao União Cascalhense. Gostou do que viu. E mais: se empolgou. Inclusive porque, mal o juiz autorizou o início da partida, o centroavante de seu time puxou a bola para um lado, deixou a marcação do outro e sapecou um belo chute. 1 a 0.

Aí, João delirou. Foi abraçado por um montão de gente, berrou feito doido. E pensou: “eu pertenço a isso, sou torcedor do União Cascalhense. Aqui, todos são como eu, somos um grupo de iguais!”. Feliz com a constatação, João sorriu.

Até que a bateria da torcida começou a puxar uma música, um axé. João era roqueiro, tinha pavor desse gênero musical. Ele olhou ao redor e viu que vários colegas da torcida cantavam a música. Então, ele achou melhor repensar sua divisão. Era, sim, torcedor do União Cascalhense, mas não era igual a todos ali. Era mais igual aos torcedores do União Cascalhense que fossem roqueiros. Fez uma busca rápida: viu um cabeludo, uma moça toda tatuada e um senhor com a camisa de uma banda que ele gostava. Deviam ter outros fora do seu campo de visão.

Isso, tinha encontrado um grupo ao qual pertencia plenamente. Certo? Não. João olhou melhor e viu que o cabeludo levava, na mochila, um adesivo do candidato presidencial que ele abominava. Não, não podia estar no mesmo grupo que aquele cidadão, eles tinham visões de mundo muito diferentes. João se negava a ser igual a quem não percebia que Lucrécio era a melhor opção para o país. Fez, então, uma nova definição para o seu grupo de pertencimento: torcedores do União Cascalhense, roqueiros e que votavam em Lucrécio para presidente do Brasil.

E cebola? Não, João também não se via num grupo de iguais com pessoas que gostassem de cebola. Nananinanão, só maluco para gostar de cebolas e João não se considerava maluco. Redefiniu: sua turma era de pessoas que torciam para o União Cascalhense, escutavam rock, votavam no Lucrécio e tinham pavor de cebola.

Mas o jogo seguia e João foi prestar atenção. Ele viu, com apreensão, o adversário empatar a partida. Lamentou quando um gol contra fez a virada. Irritou-se com o terceiro gol dos visitantes. E quando o quarto tento foi anotado, ele bufou – afinal, é contra a Alemanha que estamos jogando?


Na volta para casa, envergonhado com a derrota acachapante, João refletiu sobre o grupo de iguais que havia imaginado. E pediu para sair – já não estava assim tão convicto como torcedor do União Cascalhense.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Luto, Brazil

Mal deu conta de si naquela manhã e a dor já latejava em seu peito. Um aperto tão grande que, se fosse físico, seria mais fácil de lidar. Ligaria para um médico, tomaria algum remédio e estaria curada. Mas não, aquela dor era coisa que transcendia o corpo. Apertava seu ser.

Viu, ainda na cama, a maquiagem não retirada da noite anterior borrada no travesseiro, sujando os lençóis. Cortesia das lágrimas, cascatas da noite de agonia. Então, Deborah pensou em seus olhos, que deveriam estar inchados como nunca antes.

Curiosa, levantou e foi até o espelho. No caminho, desviou da camisa da seleção brasileira, arremessada contra a parede num acesso de raiva. No espelho, seus cabelos permaneciam deslumbrantemente loiros, mas as olheiras, de fato, denunciavam o choro. Seu rosto refletia a tragédia.


Deborah olhou para as unhas, pintadas de azul e amarelo. O ódio voltou e ela pensou em pintá-las, agora, com esmalte negro. Estava de luto. Por isso resolveu fazer um vídeo, anunciar sua frustração com o resultado das eleições. E, tal como no término com o ex-namorado ou quando o seu cachorrinho morreu, ela escolheu lidar com a situação da forma mais madura da qual era capaz: declarar que se mudaria para Miami.

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Selfieneral

A morte do ex-governador de Pernambuco, o candidato à presidência Eduardo Campos, comoveu milhões de brasileiros. Além de adorado por grande parte da população de seu estado, o neto de Miguel Arraes era a esperança de alguns eleitores, o nome da vez para a tal “renovação na política” (não sei se filho/ neto de peixe é, além de peixinho, renovação. Mas não vem ao caso). E, independente de quem seja, a interrupção abrupta de uma vida é sempre merecedora de pesar.

Em contrapartida, causou estranhamento a quantidade de selfies (as fotos de si mesmo) tiradas durante o velório de Campos. Emblemática foi a imagem de uma mulher, jovem, erguendo o celular, tombando a cabeça para o lado e mobilizando a musculatura facial em um sorriso. Tudo, claro, com o caixão ao fundo. Virou même.

O fenômeno das selfies tem uma justificativa tecnológica: com celulares e tablets é possível ao modelo ser também o fotógrafo, visualizando o enquadramento na tela, arrumando o beicinho e, olha o passarinho!, tirar a foto. No passado, sobretudo antes da era digital, apertava-se o botão e só quando era feita a revelação do filme saberíamos se a foto ficou boa. Isso se não queimava. Aí, já era, o momento histórico ficaria somente na memória.

Há, porém, mais por trás das selfies do que só tecnologia. É a reinvenção do mito de Narciso. Na mitologia grega, o jovem se apaixonou pela própria imagem refletida na água de uma fonte e morreu se contemplando. No século XXI, ele tiraria uma foto no celular e já compartilharia no Instagram, com alguns filtros para ficar mais bonito/ estiloso, e ficaria se admirando em casa, enquanto os amigos lhe dão “like”. (E eu já tratei do tema aqui )

A cultura da selfie diz mais ou menos assim: “é preciso registrar tudo. Mas não só registrar, ME registrar, também. E quem melhor para ME registrar do que EU mesmo?” É muito autoamor, muita autodevoção. Narciso curtiu.

Com tanto amor próprio que as pessoas acabam perdendo a noção do que está acontecendo ao redor. Esquecem que há um mundo bem mais complexo do que a timeline do Facebook. Pouco importa se tem sete mortos e suas famílias ou se um furacão devastou Nova York (não foi selfie, mas a Nana Gouveia também já aprontou com o bom senso, lembram?). No mundo da selfie o outro é importante, sim, na medida em que gera “likes”, compartilhamentos ou comentários como “lindos! amuuu” e por aí vai.

Ou seja, com tanta tecnologia promovendo a comunicação, a adoração própria faz o padrão geral ser o monólogo. E aí, não importa se é momento de tristeza, o importante é o fetiche da imagem de si mesmo. É preciso, mais do que experimentar o mundo, registrar-se experimentando o mundo.

Definitivamente, o “Vórtice de Perspectiva Total” como instrumento de tortura nunca fez tanto sentido. Descrito no livro “O restaurante no fim do universo”, de Douglas Adams, o "Vórtice" mostra a quem está em seu interior sua importância na perspectiva do universo. Ou seja, um pontinho invisível sobre outro pontinho mínimo.


Mas, e aí, á fez uma selfie hoje e desejou bom dia aos amigux?

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Conselheira Espiritual se defende de acusação

Se possível, favor ver o vídeo antes de ler: http://g1.globo.com/videos/minas-gerais/mgtv-1edicao/t/edicoes/v/casal-diz-ter-perdido-moradia-em-golpe-de-suposta-benzedeira-em-alterosa-no-sul-de-mg/3471103/

Prezados policiais, prezada Justiça Brasileira,

[Com cópia para as entidades superiores]

Venho, por meio desta, esclarecer as acusações feitas contra a minha pessoa. Sou a “suposta conselheira espiritual” que, procurada por um casal para ajudá-los a se livrar de problemas pessoais, teria dado um golpe e roubado R$ 65 mil reais. Não divulgarei meu nome pelo motivo de estar na clandestinidade atualmente.

Deste modo, segue o primeiro esclarecimento: não sou “suposta conselheira espiritual” coisíssima nenhuma. Sou conselheira espiritual, a popular “benzedeira”, profissão reconhecida nas instâncias do Além há mais de um século e da qual eu muito me orgulho. São mais de 30 anos de bons serviços prestados. 30 anos e uma reputação a ser preservada. Posso, num estalar de dedos, mobilizar uma porção de espíritos para testemunhar a meu favor. Inclusive este que entrega a carta aos senhores.

A respeito do golpe de estelionato que o casal equivocadamente me acusa, segue minha explicação. A família passava por um momento de tensão, com brigas recorrentes, problemas econômicos e uma extrema dificuldade de diálogo. Um quadro típico da influência de espíritos negativos, os encostos, como alguns nomeiam. Entidades de muita maldade, que quando querem atazanar alguém, são insistentes. Também me chamou a atenção um aspecto do relato da esposa. Segundo ela, dois copos se quebraram na casa em menos de uma semana. Vejam bem, estimados senhores, esses espíritos são cruéis, quando eles querem se manifestar, o quê que cai? Copos de vidro ou pratos de louça. Coisas que machucam. Nunca é um copo descartável, porque eles querem ferir. São seres ardilosos. Francamente, não sei como há quem não acredite nesse tipo de maldição.

Pois é isso. A casa estava amaldiçoada. Fiz meus rituais, sempre orientada pelos 7 Espíritos de Luz. estimados conselheiros que me leem em anexo. A presença da entidade negativa ali, infelizmente, era muito forte. Aconselhei, então, que a família vendesse a casa, numa tentativa de livrá-los do mal. Era um caminho natural. Mas eles continuaram brigando, muito. Solicitei o dinheiro, para purificá-lo, pois enquanto eles tivessem a quantia, suas vidas estariam atreladas à maldição. Infelizmente, não foi possível benzer o dinheiro de forma eficaz. Restou-me, assim, um método não muito bem quisto no plano terreno, mas super recomendado no Além: o “Procedimento de Pulverização do Dinheiro Amaldiçoado por Ser Abençoado”, no caso, eu. Pergunte, por gentileza, ao espírito que lhe entregou a carta se não é um método respeitado no Além.

Ciente da impopularidade deste procedimento entre os vivos, tão materialistas, e prevendo injustas retaliações (também sou uma vidente de qualidade, modéstia à parte), fugi. Mas espero que o mal entendido seja resolvido e eu possa voltar à minha vida comum, sem nenhum prejuízo. Inclusive porque o “Procedimento de Pulverização do Dinheiro Amaldiçoado por Ser Abençoado”, no caso, gastar os R$ 65 mil, já foi finalizado. Nada fiz que não fosse pelo bem da família.

Grata pela atenção, aguardo retorno.

Conselheira Espiritual G.

P.S.: A carta acima expressa o desejo dos 7 Anjos de Luz.

P.S. 2: Também expressa o desejo do espírito que porta esta carta. E, aviso fraternal, ele não gosta de ser contrariado.

terça-feira, 20 de maio de 2014

DEPUTADO ENCAMINHA POLÊMICO PROJETO DE LEI SOBRE COMPARTILHAMENTOS NA INTERNET

Brasília, 20 de maio de 2014 – O deputado federal Arlindo Anderson, do PZN, encaminhou um projeto de lei à presidência da Câmara que promete causar polêmica entre políticos e internautas. O documento propõe que o governo solicite ao Facebook a cobrança de uma taxa de R$0,10 de seus usuários por cada compartilhamento que eles façam na rede social. 

Com exclusividade, o WWSuicide conversou com o deputado sobre os motivos para implementar o controverso projeto de lei. “Não pretendemos censurar o compartilhamento de mensagens na rede social. Só estamos colocando um preço. Preço simbólico, inclusive. Para as pessoas terem consciência de que elas têm responsabilidades sobre o que estão divulgando. De certa forma, é uma medida educativa”, disse o deputado Arlindo.

Perguntado sobre se o projeto de lei é motivado pela crescente popularidade do perfil TV Revolta, o deputado negou. “Não é o alvo. Claro, incomoda ver as pessoas postando as mensagens dessa TV Revolta, com aquele humor deplorável, pseudopolitizado. Sem falar no tom reacionário, quase fascista do perfil. Mas não é o único alvo. Os usuários da rede social compartilham boatos sem checar as fontes. Esse tipo de atitude já custou vidas. E vou além. Acho que, se a pessoa quer compartilhar fotos de filhotes com trechos de músicas do Legião Urbana, nós não vamos impedi-la. A taxa a ser cobrada é simbólica, pensando naquele usuário que tem sua liberdade invadida ao se deparar, em plena manhã, com tamanha cafonice”.

Se o projeto de lei for aprovado, o deputado já pensa em novas medidas para expandi-lo. “Não entrou no texto, mas pretendo, futuramente, propor a cobrança de R$0,50 por fotos compartilhadas, como as chamadas selfies ou registros de viagens de férias. Não é censura, repito. Mas é comprovado que esse tipo de fotografia pode causar depressão naquele usuário, diante da conclamada felicidade alheia, se sente inferior”, finalizou ele.

A oposição, porém, já se mobiliza para barrar o projeto. O deputado Cristino Alqueires, do DEM, fez severas críticas ao projeto de Arlindo: “é um ultraje à democracia. Cobrar de uma pessoa por ela emitir sua opinião? O país estará andando para trás se esse projeto sem pé nem cabeça for aprovado.” Perguntado se faz parte da descrição de “usuário irresponsável” feita pelo deputado Arlindo, Cristiano Alqueires negou: “não. Eu gosto de Roupa Nova”. O projeto de lei será discutido em plenário nos próximos dias.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Notas sobre um linchamento

Zacarias retornou do mercado e, enquanto se preparava para abrir a alfaiataria, foi abordado por um atônito Apolônio:

- Zacarias, olha isso – e entregou ao amigo uma folha em que se lia “Jerusalém Alerta” e na qual constava um desenho de um rosto masculino.

- “Jerusalém Alerta, suposto retrato do homem que se declara Rei dos Judeus, filho de Deus”... Peraí, a gente não viu esse cara ontem?

- É isso que eu queria te perguntar. Não é aquele cabra que passou pela gente ontem?

- Tô achando que é... E o filho da mãe sonega impostos, você leu isso?

- Li. A gente se matando de trabalhar e esse marginal por aí, caluniando a nossa fé e não pagando impostos.

- Vamos à casa de Eliseu. Ele sempre sabe onde as pessoas moram por aqui.

***
Na casa de Eliseu, o velho, observado pela esposa e os três filhos, analisou o panfleto.

- Sei quem é. Trabalha em uma carpintaria, se não me engano. Fica três ruas pra lá, há uns seis quarteirões daqui.

- Vamos lá – se exaltou Apolônio. Se deixarmos para o império Romano resolver isso, já sabem como vai ser. Lei de Roma pra cá, recurso ali, Direitos Humanos... o fanfarrão do Pôncio Pilatos vai deixar por isso mesmo. Em menos de um ano esse safado vai estar solto, caluniando livremente nossa religião.

- Rei dos judeus, esse palhaço precisa ser enquadrado – disse Zacarias, apanhando algumas pedras no chão. Vem com a gente, Eliseu?

- Claro. Bartimeu e Bartolomeu, venham também – disse aos filhos, que vieram com paus na mão.

***
Durante o caminho eles se tornaram uma pequena multidão. De forma que, quando chegaram na carpintaria e avistaram o suspeito, imediatamente uma chuva de pedras veio em sua direção. Os outros empregados, em pânico, esconderam-se. Mas o alvo da multidão era outro. Atordoado com as pedradas, o sangue do corte em sua testa escorrendo em seus olhos, o suspeito foi logo dominado, amarrado em uma vara e levado para a rua.

Nem teve tempo de saber o que se passava. Enquanto era espancado, escutava frases como “cadê seu Deus-Pai agora, seu merda?” e “vou te coroar de porrada, rei dos judeus”. Um linchamento impiedoso.

Enquanto estendiam o corpo na rua, Carmelo, que vinha do centro de Jerusalém, trouxe a noticia de que um tal de Jesus, acusado de caluniar a religião judaica e de sonegar impostos, acabara de ser preso por guardas romanos.

- Vixe, então não era esse.

- Parece que não – respondeu Carmelo. Agora, vamos todos para a praça central! Dizem que Pilatos vai fazer uma votação para decidir se crucificam o meliante ou não.

- Ah, o safado não pode se safar.

- De forma alguma.


E o coro de “crucifiquem-no” já pode ser ouvido dali. 

sexta-feira, 21 de março de 2014

Análise Crítica

- Sabe, filho, você até que escreve bem, isso dá para perceber. E é criativo. Mas as suas histórias... elas não chegam a lugar algum! De verdade. Aí fica chato. Você precisa escrever histórias mais bonitas, que passem alguma mensagem, entende?

- Ah, mãe, mas eu me inspiro na vida. As coisas não vão, necessariamente, para algum lugar.

...

- Filho, acho que está na hora de você voltar para a igreja, viu.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Selfie

Esticou o braço, apontando o celular para o seu rosto. Olhou para o lado. Apertou a tela. Click.

Ergueu o celular, fez um biquinho, de leve. Apertou a tela. Click.

Mudou o celular de mão, balançou os cabelos e os jogou no rosto. Pôs a língua para fora, no canto da boca. Click.

Pôs óculos escuros no rosto. Click. Mordeu os lábios. Click. Fez carinha de “to chupando limão”. Click. Pôs um pirulito na boca. E click.

Visualizou as fotos na tela. Se curtiu. Aí, postou tudo no feicibuque. E esperou os outros curtirem.
Mas pouca gente se manifestou.


Ficou triste. Procurou uma frase de efeito para ilustrar sua tristeza. Achou uma da Clarice Lispector.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Canário Rei

Eram seis da tarde, mas a sensação térmica era de, pelo menos, três horas a menos. Pela janela, raios de sol acertavam pai e filho, deixando seus rostos brilhantes. Suor que escorria em gotas. O lanche estava na mesa e os dois não comiam com muita vontade. Faltava disposição. Nem os bravos são felizes no calor.

- Quando a mamãe chega?
- Mais tarde, filho. Hoje ela tem reunião.

O menino ainda vestia o uniforme escolar. Brincava soprando o achocolatado com o canudo. E o pai observava. Deveria repreendê-lo por brincar com a bebida, é o que sua mulher faria. Mas estava olhando para seus pés. Agora eles já tocavam no chão, apesar de estar sentado numa cadeira normal. Seu garoto crescera.

- Você tem lição de casa?
- Tenho. Mas é pouquinho.

Então, eles ouviram um canto. A televisão estava ligada, dezenas de automóveis roncavam com seus motores pela rua e, acima deles, havia um canto. E os dois se olharam:

- Vamos lá ver?

Foram. O canário estava perto, podiam escutá-lo muito bem. Estava na casa do vizinho, sobre a antena de TV paga. O fim de tarde sorria para eles, um singelo sorriso amarelo e de cabeça laranja. No mormaço da cidade, o passarinho, do alto, era rei.

Pai e filho ficaram felizes ao ver sua majestade. E o menino preparou a estilingada.