sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Flashes na Escuridão - Capítulo 3

3
Casa. Alice queria estar em casa e o relógio marcava 22:12. Tentava, apesar da miopia, adivinhar o número dos ônibus e dentre eles ver o seu. Mas este não a levaria para casa. Santa Bárbara d’Oeste não poderia ser alcançada por um ônibus circular paulistano. Com ele, Alice só chegaria até a república em que morava. Não era a casa. Porém, tinha sua cama.
Estava cansada. Saía do trabalho, em uma loja de roupas, direto para a faculdade. Curso de jornalismo, não exigia muito, o importante para a instituição era que pagasse as mensalidades. O que já era um desafio para Alice.
22:13 e as luzes se apagaram. Ver os números dos ônibus ficou ainda mais difícil. A rua era alternada por trevas e a luminosidade agressiva dos faróis de automóveis. Porém, quando os carros passavam, tudo retornava a escuridão. O ponto de ônibus, há um minuto atrás com pessoas invisíveis para a Alice, preocupada com os números dos coletivos, agora que envolto em escuridão, estava repleto de personagens bem presentes. E assustadores. Vozes sinistras, mais perto de seus ouvidos do que ela gostaria. Movimentos bruscos sentidos pelo deslocamento de ar. Todos perigosamente protegidos pela identidade escondida e ameaçadoramente propensos a atacá-la. Apertou a bolsa junto ao corpo. Puxou para baixo a saia, tentando proteger as pernas expostas.
Risadas maliciosas. Só podiam ser endereçadas a ela. Não tinha muito dinheiro, nunca tinha. Mas o celular ela não podia perder. Nem as apostilas da faculdade. O corpo, então, estava tão desprotegido! Alice tremia, a rua estava ficando tensa, vozes desordenadas pairavam por todos os lados. Outros ônibus chegavam, mas não eram o seu. E nada de as luzes voltarem.
Eram 22:21 quando as primeiras lágrimas de Alice começaram a escorrer. Então, enfim, seu ônibus chegou. Mesmo que não a levasse para casa, agora, ela só queria distância das vozes ao seu redor. Ele ia servir.

6 comentários:

  1. O maior medo seria a solidão ou a escuridão?

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  2. Nossa...
    Eu entrei no seu blog, pois perticipo da comunidade "blogs literários", e sinceramente eu nao esperava ver um texto tão bom assim. (Eu participei da "brincadeira" onde temos que comentar sobre o ultimo post da pessoa acima)
    Nossa, adorei a forma como você escreve, de verdade, parabens =D
    continue postando, viu? eu juro que entrarei mais vezes =]

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  3. gostei do texto! se interessar, dá uma olhada aqui: www.ensimesmar.blogspot.com

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  4. Adoro narrativas com frases rápidas, ainda mais aliadas a temática do medo, do imprevisivel.
    Você escreve com sinceridade e isso é tudo em literatura por isso são belissimos os seus textos. Estou emocionado em poder ler isso.

    obs: Obrigado pelo comentário no meu blog.

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