terça-feira, 22 de novembro de 2011

Discografia Recomendada: "Moon Pix" (1998) – Cat Power


Minha geração teve na infância a influência do He-Man. Além de uma série de peculiaridades que poderiam ser destacadas nesse desenho animado, lembro aqui de um padrão: os episódios terminavam sempre com uma situação engraçada, seguida de gargalhadas dos personagens principais.
Esse happy ending é um exemplo da formatação aplicada às aspirações de tantos. Se não estamos felizes, sinal de alerta, algo está errado. Nada vale a pena se não houver risada no fim. O que, no mínimo, é um tanto ingrato. Toda roda gigante tem pontos altos e pontos baixos.
Moon Pix, quarto álbum de Chan Marshall, também conhecida como Cat Power, não é sobre euforia. Pelo contrário, suas 11 faixas exalam introspecção. Sua sonoridade é crua, com a voz da cantora/ compositora acompanhada por poucos instrumentos, sempre discretos. Algo que soa bastante diferente de seu trabalho anterior, o mais experimental What Would the Community Think, de 1996.
A melodia vocal é quem guia os ouvintes em uma experiência sensorial de desaceleração. A bateria, quando aparece, apenas marca tempos arrastados, enquanto cordas de violão são dedilhadas cuidadosamente. Em alguns momentos, a voz de Cat Power é duplicada ou, em “He Turns Down”, é rivalizada por uma flauta. Mas prevalece, sempre. Chan Marshall é daquelas mulheres que, ao cantar, tornam-se musas instantaneamente. A aparência é secundária.
Desmembrar Moon Pix é quase um sacrilégio. As canções vão se ligando com grande coesão, formando uma obra única, de efeito arrebatador. Mesmo assim, o vídeo de “Cross Bones Style” percorreu “Lados B” de MTVs pelo mundo. E a versão de “Moonshiner”, famosa pela regravação de Bob Dylan (e fazer reinterpretações tornou-se posteriormente uma especialidade da moça) chamou a atenção dos folks de plantão. Em 1998, aos 26 anos, Cat Power fazia sua obra-prima.
A atmosfera do álbum é melancólica. Uma melancolia doce, sincera. Um “anti-fim de episódio do He-Man”. Pois não dá para terminar sempre gargalhando. É preciso nos observar para além do bem-estar. A tristeza pode não ser a meta de ninguém, mas deve-se reconhecer: é nela que somos verdadeiramente contemplativos.
Vale experimentar a tristeza. Não cultuando-a infantilmente, como fez o outrora numeroso movimento emo. Mas atentos para o intimismo que ela nos revela. É bom ficar a sós conosco mesmos. Até para observar o mundo de uma maneira mais sóbria.
Escutar Moon Pix pode auxiliar nessa missão. Ele é um dos momentos em que a dita “música alternativa” fez mais sentido. Pois a maioria ainda persegue as trilhas sonoras de churrasco.

2 comentários:

  1. Moon Pix está aqui no meu fone de ouvido, Chan está cantando com sua contemplação e gemidos. E estou no trabalho. Se posso dar uma opinião estética sobre o disco é que: essa melodia vocal que conduz tudo, esse som cru, coisas discretas e infiéis tamanha sua fidelidade - são os elementos que definem o termo "música independente". Pelo menos agora, parcialmente.

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  2. que lindo seu texto.
    estou escutando moon pix neste exato momento e ler este texto me alegra muito.
    abraço!

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