segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Flashes na Escuridão - Capítulo 5

5
Tuco estava de fora na sinuca. Resolveu, então, sair do bar, enquanto Alemão e Nenê enfrentavam Chicão e Cabeça. O bom da sinuca era jogar, não ficar assistindo. Lá fora, Tuco levou seu copo de cerveja e ficou observando a noite. Uma ex namorada havia dito que a favela era bonita à noite, com suas luzes desordenadas simulando um céu estrelado. “Céu estrelado! Porra nenhuma! Que céu tinha cheiro de cachorro vira-lata, poeira e cimento?” Agora, tinha certeza de como era descabido aquele comentário. Também, ele vinha da Nina. Moça bonita, bem nascida, estudante de ciências sociais. Queria estudar a sociabilidade dos excluídos, participava de projetos sociais e, então, chegou no ponto de namorar um favelado. Foi o Tuco. Achava tudo lá bonito, o samba e o funk, as pipas, as conversas pelas ladeiras, as gírias... Ela já estava planejando ir morar no morro, tinha até pesquisado aluguel, mas o namoro acabou. Para a felicidade dos seus pais, que abominavam as decisões impulsivas da filha.
Tuco gostava mesmo era de ver o bairro lá de baixo. Aqueles prédios imensos, ordenadinhos, com janelas tão grandes e sacadas com plantas. As coberturas, movimentadas nos churrascos de sábado, as quadras e piscinas com aquelas crianças limpinhas, quando não estavam com seus uniformes brancos e passados para ir à aula. Aquilo é que o encantava, ver aquelas fileiras de luzes, empilhadas e alinhadas.
Enquanto pensava, esvaziando seu copo, aquilo que comparava desapareceu. Nem na favela, nem no bairro nobre, as únicas luzes que sobraram eram as do céu. No bar, seus amigos praguejavam, já que o jogo estava interrompido. Tuco entrou e ajudou o Seu Gilson a procurava velas. Logo o bar estava iluminado novamente, naquele tom amarelo desbotado das chamas, e a sinuca pode continuar. Havia apostas, o jogo não podia parar.
Não sem algum bate-boca e reclamações, a partida terminou uns dez minutos depois. Os amigos não iam jogar outra vez. O apagão já durava algum tempo, então, em alguns cochichos, eles combinaram o que iriam fazer. Havia uma cidade lá, desprevenida, esperando que eles atacassem. Na manhã seguinte, uma nota no jornal anunciaria o arrastão, enquanto eles estariam contabilizando o saldo do saque. Era assim que as coisas eram.
Porém, naquela ação, algo se inverteu. Tuco, que admirava, lá de cima, aquele mundo ordenado dos grandes prédios, agora o tinha a seus pés. Por um breve momento, ele se fazia senhor naquela parte da cidade em que não era desejado. Agora, ele tinha poder por lá. No escuro.

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