quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Discografia comentada: “Disclosure” (2012), The Gathering


Quando, em agosto de 2007, a vocalista Anneke van Giersbergen deixou o The Gathering, o chão se abriu para os raros fãs da banda. Pois não era uma simples troca de integrante. A entrada de Anneke marcou a mudança no som do grupo, que progressivamente foi abandonando estilos mais pesados (doom/ gothic metal) para sonoridades mais atmosféricas, que a banda denominou trip rock (alusão ao trip hop de grupos como o Portishead).

Mais do que esse marco simbólico, Anneke se tornou a “cara” do The Gathering. Com sua bela voz e o assombroso carisma, a cantora não poderia ocupar lugar diferente. Foi tão protagonista na banda que resolveu dar seu vôo solo. Ser seu próprio rosto.

E agora, cinco anos depois, podemos ver que o rompimento, embora dolorido aos entusiastas do grupo, foi honesto. Everything is changing, terceiro álbum solo de Anneke (os dois anteriores usaram o nome Agua de Anique como transição) indica que a cantora está convicta em flertar com o pop. Vide o clipe de "Take me Home".

Já o The Gathering lançou nesse mês seu segundo trabalho pós-Anneke, Disclosure. Esse álbum teve maior participação de Silje Wergeland (ex-Octavia Sperati), norueguesa que assumiu os vocais. O anterior, West Pole (2009), ela encontrou praticamente pronto. E Disclosure é um atestado de que o The Gathering segue fiel ao seu trip rock, sem soar repetitivo no caminho que escolheram.

No álbum novo, os holandeses liderados pelos irmãos Hans e René Rutten incorporam mais características do rock progressivo, outro rótulo que costuma ser utilizado para definir sua sonoridade. Não o progressivo de intermináveis solos virtuoses, é bem verdade, mas na exploração da capacidade sensorial da música.

Paper Waves”, apresentada ao público brasileiro no show da banda em julho de 2011, abre o disco. É uma faixa eficaz como abertura do disco, mostra que o que virá a seguir é promissor. Os saudosistas podem até sentir falta de Anneke, mas Silje cumpre bem a árdua tarefa de substituí-la. Sobretudo por soar bem e em seu próprio estilo.

“Meltdown”, em seguida, é a música mais ousada do cd. Além do vocal masculino (estreia do tecladista Frank Boeijen na função), algo que não ocorria desde “A Life All Mine”, de Souvenirs (2003), a música inicia com uma dinâmica bastante moderna. Porém, pela metade, ela toma rumo mais introspectivo. De fato, Disclosure é um álbum de músicas longas e com variações internas. “Heroes For Ghosts”, quarta faixa, que teve um clipe lançado no ano passado, dura mais de dez minutos. Épica, mostra uma banda entrosada.

“Paralyzed”, terceira música, é a que mais se aproxima de uma balada no disco e, de fato, tem potencial para single. Conta com uma bela melodia vocal e um acompanhamento bem digno.

Disclosure tem também uma faixa dividida, “Gemini I” e “Gemini II”, essa encerrando o cd. “Missing Seasons” talvez seja a canção que menos chama a atenção no cd. “I Can See Four Miles” reforça que, mais do que faixas grandes, temos músicas grandiosas no décimo álbum de inéditas do The Gathering.

O supracitado show dos holandeses em São Paulo, no ano passado, mostrou que o impacto gerado pela saída da ex-vocalista afetou o número de seguidores do grupo. O público que compareceu naquele domingo foi consideravelmente menor que aquele do outro show da banda no Brasil, em 2006, ainda com Anneke – o tamanho do local onde os eventos ocorreram também transmite essa realidade, do Via Funchal para o Hangar 110.

Disclosure nos faz concluir que, junto da separação entre os integrantes, também ocorreu uma entre seus seguidores: foram-se os(as) tietes de Anneke, ficando os verdadeiros fãs da banda. Pois musicalmente é inegável que o The Gathering mantém sua identidade. Com mudanças, claro, pois trata-se de uma característica de sua trajetória. Mas eles seguem explorando as possibilidades do trip rock. Seus fãs da banda podem ser poucos, todavia são convictos de serem uns privilegiados.  

2 comentários:

  1. Concordo plenamente.
    Sou um desses privilegiados.
    Parabéns pela resenha

    Também fiz uma resenha da banda sobre o show em São Paulo no ano passado com visão e detalhes bem particulares detalhes antes despercebidos, quando quiser retribua a visita. Abraço.

    Folha.

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  2. Passei duas semanas sem conseguir ouvir outra coisa. O álbum é coeso, belo, intenso. E a resenha soube descrevê-lo - e à saga da banda, com ou sem sua musa maior - muito bem. Vida longa ao The Gathering e a seus admiradores!

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