quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Discografia comentada: Fiona Apple – “The Idler Wheel...” (2012)



Depois de uma espera de sete anos, os fãs de Fiona Apple receberam em 2012, enfim, o sucessor de Extraordinary Machine. E o novo álbum já se impõe no título, um poema escrito pela cantora/ compositora: The Idler Wheel Is Wiser Than the Driver of the Screw and Whipping Cords Will Serve You More Than Ropes Will Ever Do.

Mas eu pergunto: por que esperar por Fiona? A indústria musical despeja pencas de cantoras com vozes singulares e influências de jazz e rock alternativo. Eu poderia enumerar umas cinco delas se quisesse polemizar. Surgem com uma aura cult e, contraditoriamente, tornam-se populares. Para depois sumir.

Nos anos 1990, quando surgiu com Tidal (1996), Fiona Apple podia ser compreendida como um caso desses. Era claramente um achado musical. Com apenas 19 anos, ela lançava um álbum elogiado e repleto de músicas marcantes. “Sleep to Dream” e “Criminal” mostravam uma cantora com personalidade e uma admirável voz contralto. Foi hit, álbum platinado e vencedor de Grammy.

Em When the Pawl... (1999) o sucesso não foi o mesmo, mas Fiona manteve a qualidade. E nos anos seguintes, ela sairia dos holofotes, mostrando-se um caso sincero de inadaptação ao mainstream. Pois existe o glamour de “não se adaptar à fama”. No caso da cantora, porém, o incômodo com a exposição midiática é real.

The Idler Wheel... é, provavelmente, o melhor álbum de Fiona Apple, ainda que seja uma afirmação um tanto pessoal. É um cd homogêneo, as canções, apesar de compostas ao longo do hiato de sete anos, são bastante coerentes entre si. Ele é mais cru do que os anteriores, sem arranjos orquestrais ou batidas dançantes, por exemplo. De um modo geral, as músicas são construídas na base voz + piano + percussão.

Fiona Apple traduz em música seu universo, que é bastante particular em sua tempestuosidade. Nele, a doçura e a beleza não excluem tormentos, aflições e desencanto. É o caso da faixa de abertura e primeiro single, “Every Single Night”. A canção varia de um início sutil para um refrão potente, onde a cantora declara que “every single night is a fight with my brain”. Sobram asas brancas de borboletas em chamas no cérebro e ideias escorrendo na coluna da moça. E o cd começa muito bem.

“Daredevil”, em seguida, confirma que escutaremos a voz de Fiona em carne viva em The Idler Wheel... . “Valentine” seria uma balada, mas baladas não combinam com a cantora e o refrão deixa a música realmente interessante.

Mais à frente, com “Left Alone”, Apple é feroz e brada “how can I ask anyone to love me/ when all I do is beg to be left alone”. Para muitos, é incômodo ver a atual magreza da cantora, com olheiras que engolem seus olhos azuis. Não deveria. A vida, convenhamos, não é lá muito fácil de digerir. É milagre que todos nós não tenhamos distúrbios alimentares.

É um álbum curto. São 10 músicas e 42 minutos. Pouco, em números, para tanto tempo de espera. Porém, The Idler Wheel... é intenso e não há canção nele que se destaque negativamente. Pelo contrário, é preciso ressaltar a beleza de “Werewolf” e “Anything We Want”.

Assim, fica a resposta para a pergunta lá no início. Espera-se pelos retornos de Fiona Apple porque eles não decepcionam. Seu ritmo lento de produção não esconde uma artista em decadência. Pelo contrário, parece ser uma condição necessária para que ela produza álbuns sinceros. E que, ao que tudo indica, valem mais do que quase tudo que foi feito na música pop de 1996 para cá.

*Em tempo: foram anunciados três shows da Fiona Apple no Brasil. A novaiorquina passará por Porto Alegre (27/11), São Paulo (29/11) e Rio de Janeiro (30/11). 

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